Nesta segunda-feira (10), o Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (ICHC FMUSP) abriu a programação do Mês da Mulher com a exposição “Corpos das Penhas”. Dezesseis corpos de madeira, com placas detalhando nomes de vítimas de feminicídio na cidade de São Paulo, chamam a atenção para a violência contra a mulher.
A abertura do evento contou com as presenças do Prof. Dr. Aluísio Augusto Segurado, Professor Titular da FMUSP e Pró-Reitor de Graduação da USP; Prof. Dr. Nelson De Luccia, Presidente do Conselhor Diretor do ICHC; Profa. Dra. Anna Sara Shafferman Levin, Professora Titular da Disciplina de Moléstias Infecciosas e Parasitárias do HCFMUSP; Profa. Dra. Rafaela Alkmin, Vice-Diretora do Corpo Clínico do ICHC; Dr. Marcelo Cristiano de Azevedo Ramos, Diretor Adjunto do ICHC, representando a Dra. Danielle Pedroni Moraes, Diretora Executiva do ICHC; Profa. Dra. Ivete Boulos, Médica Assistente e Coordenadora do Núcleo de Assistência à Vítima de Violência Sexual (NAVES) da Divisão de Clínica de Moléstias Infecciosas e Parasitárias do ICHC; e Carolina Carrolo Messias, Psicóloga do Centro de Defesa e Convivência das Mulheres (CDCM).
VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER
Os “Corpos das Penhas” escancaram a crueldade cometida contra mulheres, em sua maioria negras e periféricas, de 20 a 40 anos. Mães, estudantes, trabalhadoras, donas de casa. Mortes por arma de fogo, estrangulamento, golpes de faca, e, até mesmo, cadeiradas. Todas cometidas por ex-companheiros que alegaram não aceitar o fim do relacionamento. Ataques feitos na residência da vítima, na rua, ou em seu local de trabalho.
Dados da Organização das Nações Unidas (ONU) revelam que 85 mil mulheres e meninas foram mortas intencionalmente no ano de 2023 (140 por dia, 1 a cada 10 minutos). Desse montante, 60,2% (51.100) dos assassinatos tiveram como autores parceiros íntimos ou outro membro da família.
O Brasil ocupa o 5º lugar no ranking mundial de feminicídio. Até outubro de 2024, o Sistema Nacional de Informações de Segurança Pública (Sinesp) registrou 1.128 mortes, superando a triste média de mil mortes anuais por este crime, tipificado em lei de 2015 e inserido no Código Penal.
DESCONFORTO NECESSÁRIO
Na abertura da exposição, feita no hall de entrada do ICHC, a psicóloga Carolina Carrolo falou sobre como as imagens podem gerar desconforto, e que isso é proposital. “Onde estão vocês para encarar essa realidade e agir?”, questionou o público. “A denúncia [da violência] não é o fim, é o começo”.
A Dra. Ivete Boulos enfatizou quem são os verdadeiros algozes dessas mulheres, cujas vidas foram interrompidas drasticamente. “É um crime que acontece dentro das relações afetivas. Quem são as Penhas? Negras, jovens, pobres, e que morrem em casa, no lugar que escolheram viver com a pessoa. Os parceiros cometem [o crime], muitas vezes, na frente de seus filhos menores. São mortes intencionais. Não podemos ignorar os alertas, os pedidos de socorro”.
Para a Coordenadora do NAVES, a recepção dos “Corpos” no ICHC e, posteriormente, na Faculdade de Medicina, demonstra a “importância de trazer para uma população acadêmica, universitária”, enfermeiros e professores, o “compromisso de educação na saúde”. Para ela, “é muito interessante ensinar para eles como atender com humanidade, como atender com acolhimento especial as pessoas que sofrem violência, principalmente as mulheres”.
“Na violência doméstica, os homens, os parceiros e ex-parceiros, são os verdadeiros agressores”, explicou a Dra. Ivete.
“Na violência sexual, que vai, desde as vezes, da tenra idade até as idosas, o agressor está dentro de casa, também. Pode ser um marido, o ex-marido, mas geralmente – principalmente em crianças – é aquele agressor conhecido. O agressor, às vezes, toma café da manhã, almoça e janta com a vítima. É uma violência de intersecção de violência psicológica muito forte.”
Para a Profa. Dra. Anna Sara Levin, o “feminicídio é a ponta do iceberg. O que a gente vê aqui é o que não pode ser escondido”.
Ponto de vista corroborado pela experiência da Dra. Ivete Boulos no atendimento no NAVES. “Nós atendemos mulheres, aqui, na faixa de idade de 20, 30, mais de 30 anos, que vêm falar para a gente pela primeira vez, nos contar, sobre a violência sofrida na meninice, com 8 anos, com 10 anos, no começo da adolescência, que se estendeu para a adolescência até a sua idade jovem”, lembrou. “Silenciar leva a um adoecimento imenso!”
O Prof. Dr. Aluísio Augusto Segurado destacou a “necessidade de trazer para o nosso ambiente uma reflexão tão dolorosa, porém tão necessária”.
SERVIÇO
A “Corpos das Penhas” ficará aberta à visitação no Centro de Ensino Berilo Langer (5º andar do ICHC) e no PAMB até o dia 17 de março. Depois, seguirá para a Faculdade de Medicina, em revezamento com outra exposição, “Olhe em meus Olhos” (de 17 a 21 de março).
- Você não está sozinha! Caso esteja sofrendo ou saiba de alguém que está sofrendo violência, denuncie: ligue 180 (Central de Atendimento à Mulher).